Jam session prog rock em 11/01/2025.
Guitarra: João Paulo Pessoa / Bateria: Vinícius Galvão / Baixo: Jairo neto.
Um reencontro mágico e histórico.
"No novo tempo. Apesar dos castigos. Estamos crescidos. Estamos atentos. Estamos mais vivos. Pra nos socorrer. ..." (Trecho da canção Novo Tempo de Ivan Lins)
2025 ... Como diremos sempre ao longo desse ano: 20 anos do The Tao of the Guitar. Estamos desde 2005 compartilhando aqui ideias e pensamentos relacionados ao nosso fazer musical. A razão desse post é apontar possíveis novos rumos para o The Tao of the Guitar, sem deixar nossa essência se perder e/ou se desvirtuar.
Alguns poucos posts atrás, eu divulguei aqui a estréia do meu podcast "João Paulo Pessoa", onde, no primeiro episódio, eu conto resumidamente minha trajetória como músico e meu caminho de órfão desolado e perdido, passando por guitarrista de rock em bandas alternativas do Recife, e chegando a professor efetivo de violão erudito no Conservatório Pernambucano de Música, a mais respeitada e conceituada escola de música de nossa região, onde leciono desde o ano de 2010, quando conquistei a Cátedra de Professor Efetivo de Violão Erudito, via concurso público. Nesta jornada que narro no primeiro ep. do meu podcast, cito os nomes dos meus grandes amigos, e parceiros em experiências sonoras, Vinícius Galvão (que foi meu companheiro de grupo na histórica banda de prog rock recifense Van Ludwig*, onde ele tocava bateria) e Jairo Neto (outro companheiro do mundo do rock'n'roll, com quem toquei na famosa banda de trash metal pernambucana Cruor**, da qual Jairo é, e sempre será, o baixista, vocalista em tempos de crise, mentor intelectual, "espírito sombrio" e articulador de ideias insanas).
Pois bem, acontece que, não por acaso, alguns dias depois de ter postado essa narrativa nas redes (através do sofisticado emaranhado de dispositivos de divulgação das minhas ideias confusas), aconteceu no dia 11 de janeiro de 2025, em um bar do Recife chamado "Bacabelha", o meu retorno oficial ao mundo do Rock'n'roll através de uma jam com Jairo e Vini. Estou aqui então, escrevendo este post para tentar descrever a sensação de estar a pelo menos 25 anos afastado do sentimento único de estar no palco com um power trio fazendo prog rock e, de repente, se ver com uma guitarra elétrica nas mãos improvisando meus solos como se nunca tivesse me afastado deles.
Mas, vamos por partes (como dizem alguns profissionais de áreas mais ligadas a assuntos comerciais do dia-a-dia): tudo começou com uma postagem no instagram. Não ... não foi isso, foi bem antes ... mas como tudo é extremamente confuso de explicar, vamos supor uma plausível simplicidade para conseguir o feito de colocar isso em palavras de uma maneira minimamente compreesível.
Jairo já falava comigo há muito tempo sobre como seria interessante se eu voltasse a tocar guitarra elétrica. Neste sentido, o meu amigo chileno, Matias Anguita Echiburu foi um precursor de ideias ... Sinceramente, Matiitas me enchia a paciência praticamente exigindo por anos que eu voltasse ao mundo do rock com minhas frases improvisadas de guitarra elétrica. E por mais que eu explicasse que estava envolvido com outras imaginações artísticas, mais ligadas ao universo segoviano da emulação de realidades orquestrais nas miniaturas dos sonhos violonísticos, etc etc ... Ainda assim, Matiitas não se conformava e, literalmente, me enchia a paciência. Chegou num ponto em que tive que bloquear Matias no instagram (ainda está bloqueado, na verdade), mesmo continuando a sentir um imenso amor fraternal pelo meu brother chileno, que, por sinal, foi um dos grandes responsáveis por eu gostar tanto assim de Deep Purple até hoje em dia. Portanto, Matiitas foi influente de certa forma no meu gosto pela guitarra elétrica e pelo volume da eletricidade. Matias Anguita Echiburu, apesar de ser um pouco chato às vezes, nunca deixou de ocupar um lugar de irmão em meu coração sonoro.
Mas, voltando aos pedidos menos enfáticos de Jairo Neto por um retorno meu ao rock'n'roll, uma inteligente ideia dele foi propor ao meu grande irmão Vinícius que também conversasse comigo ... isso já tem um bom tempo. Anos. E eu, como bom obstinado que sou, sempre tentava explicar meus "sonhos segovianos" e justificava minhas escolhas explicando com fervor, quase religioso, a sofisticação do poder polifônico do violão, a delicadeza e sutileza do formato das unhas de um violonista, a imensa necessidade de imersão psicoacústica para a manutenção de uma pretensa habilidade de trânsito estilístico temporal no repertório do violão clássico, as incompatibilidades entre as técnicas de mão direita e esquerda no violão cássico e na guitarra elétrica, entre outras explicações técnicas que deviam parecer delirantemente absurdas para os meus amigos do rock'n'roll, mas, que correspondem, de fato, a uma pragmática realidade (ou quase isso, pelo menos). Mas, enfim, algum tempo depois, eu mesmo acabei me convencendo (não sei exatamente como) da necessidade de voltar a tocar guitarra elétrica. Curiosamente, e para minha surpresa, estou estudando mais violão clássico agora, depois de voltar ao rock e à guitarra eletrica ... paradoxos.
Continuando esta postagem um tanto quanto difusa de hoje, vou explicar de maneira breve e objetiva (não acredite nisso) o que aconteceu no dia 11 de janeiro de 2025.
Decidimos, eu, Jairo e Vini, que haveria um reencontro musical. Que tocaríamos em power trio. Mas, o que tocariamos? Não tínhamos muita ideia. Apenas combinamos de fazer isso no sábado, 11/01 ... (Sabbath!). Inicialmente seria apenas um ensaio em estúdio. Mas, Jairo nos falou da possibilidade de tocarmos ao vivo, para uma pequena platéia, numa curta apresentação de 10 minutos, no sábado à noite, lá no Bacabelha - o bar onde Jairo toca blues nos sábados à noite, integrando o trio do guitarrista recifense Rodrigo Morcego. Nossa jam seria no intervalo da apresentação de Morcego. Só precisávamos respeitar o tempo disponível que seria de dez ou quinze minutos. Nas palavras dele "não pode passar de quinze minutos de maneira alguma". Tanto eu quanto Vini achamos prudente aceitar a oferta totalmente irresponsável que Jairo nos fez, de nos juntarmos para tocar ao vivo para uma platéia, depois de aproximadamente 30 anos que não tocávamos juntos.
Na verdade, pelo menos no meu caso, eu não me apresentava em público com uma guitarra elétrica numa formação power trio há, no mínimo, 20 anos. Acho que a última vez que subi num palco com uma guitarra elétrica à frente de uma banda foi durante o meu curso de Licenciatura em Música na UFPE, provavelmente antes do ano de 2002. Na época, tínhamos um grupo de música instrumental chamado "Da Licença" e tocávamos em eventos da nossa universidade. Depois disso, ingressei no mundo do violão e da música clássica e minhas apresentações passaram a ser sempre acústicas (em teatros ou igrejas), com o meu repertório de violão solo, música de câmara com o "Duo Pessoa da Silva", além de outras formações e experiências nesse sentido. Mas, nada de rock, prog e muito menos guitarra elétrica ou qualquer outra coisa que estivesse plugada.
Acredito que no caso de Vini tambem não foi muito diferente, uma vez que já faz muitos anos que o monstro da batera - Vini - deu lugar ao Prof. Vinicius Galvão, um pacato e muito atuante psicólogo, professor e pesquisador dos problemas que atordoam a alma humana ... tendo trocado as baquetas por ferramentas freudianas, mais sutis, há bastante tempo.
De qualquer maneira, decidimos (pelo menos eu e Vini) que era hora de voltar ... e a melhor maneira era simplesmente voltar como quem nunca partiu. Começamos nossa jam improvisando sobre uma música que tocávamos no setlist do Van Ludwig: nossa própria versão instrumental para o Tema para a Procissão de N. Sra. Mãe dos Homens, uma música composta pelo pai de Vinícius, o médico e compositor Luis Paulo Galvão***. Para completar o risco de ser um completo fiásco, Vini havia nos avisado: "Papai estará na plateia hoje à noite". Mas, magicamente, ao começarmos a tocar, vi que isso que falam os mais antigos sobre "o espírito do rock'n'roll" ou coisa parecida, de alguma maneira é, de fato, verdade. Ficamos possuídos pelo som que produzíamos ... Jairo estava totalmente integrado nos graves com as emulações tribais primitivas das viradas da bateria de Vini ... eu fechei os olhos e simplesmente permiti que as notas embaixo de meus dedos falassem por mim ... De repente, estávamos improvisando em cima do tema de "The Rover" do Led Zeppelin, depois improvisos puros, soltos, originais ... e, por um tempo, não sabíamos mais em que estrutura musical estávamos ... naturalmente (sem pensar mesmo) o riff de Purple Haze de Jimi Hendrix surgiu em baixo dos meus dedos e, instataneamente, o clima mudou. Jairo e Vini me seguiram em outra paisagem sonora por mais algum tempo ... até que, como que prevendo um devaneio, Jairo puxa, em plena euforia hendrixiana, o Tema para a Procissão de N. Sra. Mãe dos Homens novamente ... e, aos poucos, fomos voltando, voltando, voltando... Em aproximadamente dez ou doze minutos de Jam Session, desenvolvemos de maneira quase instintiva uma estrutura musical coesa de três movimentos, tornando assim a nossa jam uma verdadeira "Experiência Prog".
Provavelmente, as coisas não aconteceram exatamente assim ... mas, foi a forma que consegui de traduzir em palavras o que senti naquela noite sonora com os meus amigos do rock'n'roll, Vini Galvão e Jairo Neto. Aproveito também para agradecer ao guitarrista Rodrigo Morcego pela força, cedendo o espaço para nossa jam e, ainda por cima, me emprestando sua Gibson Les Paul para eu tocar naquela noite. É como eu disse lá no dia: "Marcelo, meu velho, você é o cara!"
Espero que este relato verídico (ou muito próximo disso) sirva de inspiração para que você pegue agora o seu instrumento musical e vá praticar. Como diz o professor e guitarrista de jazz pernambucano Nilton Rangel: "Todo dia um pouquinho, aqui. Meu filho. amanhã, melhor. Dez reais"
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*O Van Ludwig foi uma banda pernambucana, recifense, de prog rock, que atuou fortemente na cena underground do Recife, entre os anos 1988 e 1998. Era um quarteto que contava com a seguinte formação: Daniel Duarte (Teclado e Voz), Leonardo Nunes (Baixo e Voz), Vinícius Galvão (Bateria) e João Paulo Pessoa (Guitarra Elétrica). Apesar de termos gravado duas "fitas-demo" em estúdios e termos feito alguns programas de rádio (principalmente aparições no programa "Faixa Local" da Rádio Universitária FM), além de diversos shows (alguns dos quais lembro que foram registrados em fita cassete) ... ainda assim, não tenho até o presente momento nenhum registro disponível de nossas gravações. Mas há esperança. Estamos tentando entrar em contato com pessoas que podem possuir alguns desses registros.
**Escute aqui o CD do Cruor gravado em 1995. Tive a honra de fazer parte do Cruor e ser o guitarrista da banda na época da gravação deste CD. Algumas das obras do disco (como Insane Harmony, Game of Words, Banditry, entre outras) são também de co-autoria minha, junto com Jairo Neto e Zeca Aranha. Aqui está o link para a página do Cruor na plataforma Bandcamp: https://cruor.bandcamp.com/album/cruor
***Escute aqui o EP de Luis Paulo Galvão, "Cheguei Recife": https://music.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_kKyOgOmA2UQUOfEvisgmxkrd5m-UaDVGw&si=j5K4Hj-Q7KOxI8b3 ... N. Sra Mãe dos Homens é a terceira faixa do EP.
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Agradecimentos muito especiais a Maria Flor ... pela revisão do texto e pela imensa força de sempre.
Grande abraço musical e bons estudos.
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Joaõ Paulo Pessoa.